Acerca do prazer, é fundamental saber o que é, como consegui-lo, e em que grau. Sendo assim, torna-se necessária uma pequena reflexão sobre o assunto.
O prazer é, antes de mais, um vício. Algo que queremos repetir, que nos satisfaz, mas não nos sacia. Simplificando, porque não há muito a dizer sobre o assunto, prazer é tudo o que nos faz sentir bem.
A mim dá-me prazer fumar um cigarro à janela, já noite escura, ou recostar-me no sofá e ficar a olhar para a televisão, ou ouvir música, ou escrever, e poderia lembrar-me de tantas coisas mais que lhes perco a conta. Assim, para obter prazer, basta fazer algo de que goste, ou com quem gosto, nada mais, e isso deixa-me feliz.
Acontece que o que nos dá prazer, nem sempre dá com a mesma intensidade, o que levanta a questão de saber o porquê. Porque não é sempre igual, porque é que o grau de satisfação é variável?
Hoje, o cigarro à janela, já noite escura, soube-me especialmente bem. Ontem também me soube bem, mas não foi "especial", como o de hoje. Terá sido a temperatura amena, o cheiro do chão molhado, o silêncio, ou quaisquer outros factores alheios ao prazer de fumar que fizeram com que o cigarro me soubesse tão bem, que esse momento se tornasse especial?
O cigarro, o acto de fumar, é sempre um prazer - nem que seja para o corpo, sedento de nicotina. O que torna um prazer especial, o que o faz grande, é, acima de tudo, a disponibilidade mental para o apreciar. Mais que a temperatura ou os pés quentes, o que me fez deleitar com aquele breve momento, foi o facto de eu o desejar, de estar absolutamente concentrado nele e no prazer que me estava a proporcionar.
Sendo assim, o prazer não é um conceito facilmente mensurável, porque o prazer que retiramos, seja daquilo que for, está dependente de tantos outros factores, que a intensidade do prazer acaba por ser uma questão mental. Acontece que, frequentemente, o prazer vem desequilibrado. Porque não vem no tempo certo, ou no lugar certo, ou com a pessoa certa. Por vezes acontece assim, é um facto. E quando assim é, temos tendência a atirar a culpa para essas questões de oportunidade, para justificarmos, a nós próprios, o porquê do prazer ter sido pequeno, quando podia ser grande.
É fácil entender como se trocam prazeres intensos por pequenos prazeres, afinal, vivemos a correr e temos sempre mais em que pensar do que em nós próprios e no que nos dá prazer. Infelizmente, esta atitude gera o mito dos grandes prazeres, como se fossem raridades. Não são. São vulgares, nós é que colocamos barreiras e obstáculos a nós próprios que nos impedem de os desfrutar, por isso os julgamos uma raridade.
Naqueles momentos em que nos dedicamos a algo que sabemos que nos dará prazer, quando é nisso que a nossa atenção e os nossos sentidos se focam, desfrutar de um grande prazer é inevitável. Noutros momentos, o prazer bate-nos à porta quando estamos a pensar no emprego, naqueles olhos castanhos, na conversa da porteira, e o prazer, que podia ser grande, é pequeno.
Porquê arranjar desculpas se está na nossa mão definir o quão bom vai ser? Se me concentrar o suficiente, todos os momentos são de enorme prazer, porque cada prazer tem a sua natureza e não pode ser equiparado aos outros, cada um tem o seu momento, o seu espaço, o seu tempo, mas somos nós que controlamos esses factores, não são eles que nos controlam a nós. Todos os momentos de prazer devem ser plenamente desfrutados no momento e no lugar em que nos são oferecidos, porque todos os prazeres são grandes se os soubermos aproveitar, se nos concentrarmos no que realmente queremos. E o que realmente queremos não é o momento nem o espaço, o que realmente queremos é o prazer, é esse o alvo único da nossa atenção.
O hedonismo é parte daquilo que nos define como humanos, porque o prazer, grande ou pequeno, singular ou colectivo, é o objectivo último da nossa existência. Esta fórmula está contida nos genes da humanidade, e diz que todos nós procuramos a felicidade que só pelo prazer podemos ter.
"Hedonismo, s. m. sistema filosófico que considera o prazer como fim último da vida."
Não interessa onde ou como procuramos a felicidade, interessa apenas o que nos dá prazer, para nos sentirmos felizes, e valer a pena viver.
Desculpe lá, mas não concordo que o prazer seja um vício. Ter prazer em ajudar os outros, por exemplo, é um vício?
ResponderEliminarIsto foi só uma provocaçãozinha, não leve a mal...
De maneira nenhuma, os estímulos são sempre bem vindos.
ResponderEliminarComecei a escrever a resposta, mas alongou-se de tal forma, que resolvi publicá-la no blog.
Assim sendo, tenho a agradecer-lhe as "janelas" que a sua opinião divergente me abriu.