- Se te dissesse a verdade?
- Não queria ouvi-la.
- Se te mentisse então?
- Tapava os ouvidos para não te escutar.
- E se te mostrasse o mundo?
- Fechava os olhos e fingia não ver.
- Não entendo então, o que queres de mim?
- Tudo o que tens para me dar.
- Eu não tenho nada, nada para dar, só isto que sinto...
- É só isso que quero, mais nada senão isso.
- Mais nada?
- Isso é tanto, isso é, tudo!
- E tu?
- Dou-te tudo o que quero de ti.
- Tudo o quê?
- Tudo o que quiseres.
- Não sei o que quero.
- Alguma coisa hás-de querer.
- Quero-te a ti.
- Já sou tua.
- Como, se não te tenho?
- Tens sim, estou aqui.
- Não tenho, estás aí.
À distância de um toque, demasiado longe para que a possa tocar, demasiado perto para que a possa amar.
"Ele não vê? Ele não entende? Estou aqui e sou dele."
"Como pode isso ser? Diz que é minha, mas não a tenho."
"Amo-te, não consegues perceber?"
"Porque não consigo viver esse amor que ela diz sentir? Eu amo-a, é a única certeza que tenho."
"Será que ele não me ama? Estarei a desperdiçar a minha vida com um homem que não entende que o amo?"
"Tenho medo."
"Estou farta, tenho de lhe dizer."
- Cansas-me.
- Também estou cansado de mim.
- Será que não entendes uma única palavra do que te digo?
- Talvez não...
- Não sei mais o que te possa dizer. Dava a minha vida por ti, por amar-te demasiado.
- ...
- Pelo menos responde, diz qualquer coisa.
- Amo-te.
- Não sabes amar.
- Amar tem uma forma?
- Estás a ver, é isso que me irrita.
- Isso o quê?
- Isso, de pensares demasiado nas coisas, de não te concentrares no essencial.
- Essencial é amar-te.
- Dizes isso, mas não o sinto em ti.
- Porque não entendes.
- Não entendo o quê?
- Que é assim que te amo.
- Assim como? só vejo... nem sei o que vejo nisso a que chamas amar.
- Vês-me a mim, como sou, exactamente eu.
"Juro que queria entender, que queria sentir como me ama."
"Não sei mais como lhe explicar que ela é a razão porque respiro, por que vivo."
- Calas-te sempre que falamos de nós.
- Não sei dizer por palavras o que me liga a ti.
- Exprimes-te demasiado bem para não saber o que dizer.
- Eu tento.
- Então explica-me, por palavras, para que possa entender.
- Não sei dizer, não sei explicar... - uma lágrima.
- Por favor, só por uma vez, mostra-me esse amor que quero tanto.
Calam-se ambos. Amam-se. Não sabem como - pelo menos ele não sabe, ela talvez. Ficam assim, cabisbaixos, sisudos, a olhar um para o outro. Os olhos cruzam-se. O desejo cresce exponencialmente. Calam-no. Estão demasiado presos às palavras. Os sentimentos cedem. Comunicar tem preceitos. Falar é um preconceito. Não entendem, nem um, nem outro. Não são as palavras, são os lábios, é a pele, é o peito a arfar. Amar é estranho, para eles. Nenhum deles é capaz de entender. Não há nada para entender no amor. Mas eles não conseguem perceber. Estão demasiado ávidos de explicações. Ele na sua loucura, ela na sua demanda por sanidade. São um do outro, mas não se pertencem, afastam-nos as palavras que não conseguem partilhar.
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